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Advogados avaliam impactos e respondem a questões sobre desaposentação

images66.jpgRENÚNCIA A DIREITO

13 de outubro de 2014, 10h31

A desaposentação é a possibilidade de o trabalhador, depois de aposentado pela primeira vez, voltar a trabalhar para se aposentar de novo, com um benefício maior, que inclui as novas contribuições do último período de trabalho. Caberá ao Supremo Tribunal Federal decidir se esse movimento pode ser feito ou não.

O julgamento do assunto começou na quarta-feira (8/10) e foi suspenso no dia seguinte, após o ministro Luís Roberto Barroso, relator da de recurso a respeito, ler seu voto. Logo depois da leitura, o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, determinou o intervalo da sessão. Quando os ministros voltaram, o presidente decidiu suspender o julgamento, já que três ministros estavam ausentes.

A discussão é uma das que mais preocupam o governo federal. De acordo com a Advocacia-Geral da União, o impacto nos cofres federais nos próximos 20 anos pode chegar a R$ 50 bilhões caso a hipótese seja admitida. Já há inúmeras decisões de outras instâncias a respeito, contra e a favor.  Mais uma vez de acordo com os cálculos da AGU, tramitam hoje mais de 123 mil ações de segurados desde 2009 a respeito.

Para esclarecer alguns pontos, os advogados Theodoro Vicente Agostinho eSérgio Henrique Salvador, autores do livro Desaposentação – Instrumento de Proteção Previdenciária (editora LTr.), responderam às dúvidas mais comuns. Leia abaixo: 

O que é desaposentação? 
É a renúncia [à aposentadoria a que já se tem direito] para se colocar em uma situação mais favorável, mais vantajosa para o segurado.

Quais são seus efeitos
Enquanto beneficiário, o segurado é regido pelo regime jurídico da condição de aposentado, inativo, que se reflete em várias áreas da legislação, como a civil, trabalhista, previdenciária, fundiária, tributária etc. Quando cessa o benefício por via da desaposentação, alguns desdobramentos se apresentam. Ele retornará à condição de segurado não aposentado enquanto não fizer jus à nova aposentadoria.

Desaposentação é diferente de Recálculo da Renda Mensal Inicial?
Sim, são ações e pedidos diversos, que não devem ser confundidos, sem considerar que, administrativamente, a revisão de cálculo do benefício previdenciário pode ser feita sem o crivo do Judiciário.

Quando é conveniente brigar por uma desaposentação?
Quando, por exemplo, o segurado é aposentado no setor privado e, agora, quer ir para o setor público via concurso. Porque, no setor público, ele terá a aposentadoria integral. Também quando o segurado tem a aposentadoria proporcional e quer renunciá-la para conseguir a aposentadoria integral. Nesse caso, deve-se, necessariamente, apresentar os cálculos ao juiz para a demonstração da situação mais vantajosa. Além disso, deve se ter em mente que, quando vai se fazer o cálculo, deve ser pela metodologia nova. Até 1999, o período básico de cálculo eram as 36 últimas contribuições. Depois disso, é 80% de todo o período, uma vez que não dá para misturar regimes diferentes. Outra hipótese é quando o segurado quer passar de aposentadoria por idade para a aposentadoria por tempo. Essa situação visa reparar uma injustiça na medida em que o sistema de acumulação de aposentadorias no Brasil favorece o rico. Por exemplo: quem se aposentou no serviço público, pode acumular seu benefício com o do regime geral de previdência. Porém, quem se aposentou no regime geral não pode acumular outros tipos.

Durante a discussão judicial, o INSS continua pagando o benefício anterior? 
Sim, até que sobrevenha a coisa julgada judicial. Não acontecendo nada que afete a manutenção do benefício, esse direito se mantém íntegro.

Quando cessa o benefício renunciado? 
Quando há a distribuição da ação. Aí, deve ocorrer a execução das parcelas pretéritas.

Os valores precisam ser devolvidos? 
Em que pese ser um assunto intrincado no âmbito doutrinário e jurisprudencial a respeito, entendemos que não há necessidade de devolução dos valores. Isso porque a desaposentação, enquanto renúncia, é uma sentença de natureza desconstitutiva, tendo efeitos ex nunc. A decisão não tem efeitos pretéritos, sem prejuízo da natureza alimentar da verba envolvida.

Pode haver desaposentação sem a existência de ato administrativo que conceda o benefício? 
Não. Obrigatoriamente, deve ser observado que o ato administrativo da concessão do benefício tem de estar concluído, senão, não é caso de desaposentação.

Qual o instrumento jurídico adequado para se pedir desaposentação na Justiça? 
É a Ação Ordinária de Desaposentação. Não se deve fazer o Mandado de Segurança, posto que, neste, as provas devem estar pré-constituídas. Deve-se pedir a renúncia ao benefício para a obtenção de outro benefício mais favorável. Também deve haver um pedido de não restituição de valores por causa da questão dos efeitos econômicos pretéritos.

E quais são os argumentos jurídicos a favor?
São os princípios da dignidade e da solidariedade. Essa questão só pode ser resolvida com argumentos baseados nos direitos fundamentais. No pedido da ação, deve-se deixar claro que não se trata de revisão nem de recálculo de benefícios. E o autor tem o ônus de provar a situação mais vantajosa para ter deferido o seu pedido.

Há diferença entre renúncia e desaposentação? 
Sim. A Turma Recursal de Santa Catarina fez a seguinte diferenciação: “Na renúncia, o segurado abdica de seu benefício e, consequentemente, do direito de utilizar o tempo de serviço que ensejou sua concessão, mas não precisa restituir o que já recebeu a título de aposentadoria. Ou seja, opera efeitos ex nunc. Na desaposentação, o segurado também abdica do seu direito ao benefício, mas não do direito ao aproveitamento, em outro benefício, do tempo de serviço que serviu de base para o primeiro. Para tanto, faz-se necessário o desfazimento do ato de concessão, restituindo-se as partes, segurado e INSS, ao status quo ante, o que impõe ao segurado a obrigação de devolver todos os valores que recebeu em razão de sua aposentadoria. Logo, a desaposentação nada mais é do que uma renúncia com efeitos ex tunc. (Relator Juiz Ivori Luis da Silva Scheffer, 5/08/2004, Processo de 2004.92.95.003417-4).

Com o efeito ex tunc, o aposentado é obrigado a restituir o que já recebeu?
Segundo os posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, presente um efeito ex tunc, o aposentado teria de devolver o que recebeu. Mas com o efeito ex nunc, não haveria necessidade dessa devolução.

Existe previsão legal na Lei 8.213/1991, que regula a Previdência, sobre a desaposentação? 
Em específico, não. Entretanto, o que não é vedado é permitido, conforme o postulado constitucional da legalidade. Não existe lei vedando a desaposentação, senão apenas um simples decreto e uma instrução normativa do INSS. O artigo 181-B do Decreto 3.048/1999 e outras disposições é que baseiam os argumentos da Previdência.Ocorre que decretos e instruções normativas obrigam apenas os agentes, servindo apenas como recomendação aos particulares.

Qual a posição do INSS? 
Sempre é a de que as aposentadorias são irreversíveis e irrenunciáveis. Dessa forma, não há a necessidade do prévio ingresso pela via administrativa, posto que há norma expressa que impedirá o agente do INSS em conceder e protocolar o pedido de desaposentação.

A desaposentação foi sumulada? 
Existem apenas duas súmulas: uma do TRF-4 — a Súmula 3 —, que admite a desaposentação e exige a restituição de todos os valores; e outra do TRF-2 — a Súmula 70 —, que é contra a desaposentação dentro do mesmo regime geral da previdência.

O Superior Tribunal de Justiça já chegou perto de sumular a questão? 
Devido ao pequeno número de julgados e as divergências sobre a restituição, ainda não há elementos suficientes para codificar, de matéria estática, um pensamento sumular a respeito. Há de se ressaltar que o STJ se posiciona favoravelmente à desaposentação, mas ainda há dissenso acerca da devolução das mensalidades recebidas após a aposentadoria.

Qual o posicionamento do STF? 
Em setembro de 2010, o ministro Dias Toffoli  pediu vistas de processo que já conta com o voto favorável do ministro relator, Marco Aurélio.

Pode-se obter uma certidão de tempo de contribuição do período da aposentadoria? 
Sim, pois a aposentadoria é direito patrimonial disponível e, portanto, passível de renúncia, para eventual obtenção de certidão de tempo de serviço/contribuição.

Há precedente judicial nesse sentido? 
Dentre vários outros, citamos o proferido pelo TRF da 4ª Região, com a seguinte ementa: “Previdenciário. Processual Civil. Renúncia a benefício previdenciário em outro sistema de previdência. Necessidade de restituir os valores auferidos a título de aposentadoria. Se o segurado pretende renunciar ao benefício concedido pelo INSS para postular aposentadoria junto a outro regime de previdência, com a contagem do tempo que serviu para o deferimento daquele benefício, os proventos recebidos da autarquia previdenciária deverão ser restituídos. Embargos Infringentes providos”. [EIAC 1999.04.01.067002-2/RS, 3ª Seção, Rel. Des. Fed. Luiz Fernando Wowk Penteado, DJU de 15/01/2003].

O fim do pecúlio contribuiu para esse fenômeno jurídico? 
Com certeza, já que, com a Lei 8.870/1994, estudiosos se deram conta da necessidade de refletir sobre o destino das cotizações vertidas por quem se aposentou e continuou trabalhando e vertendo as contribuições previdenciárias. De certa forma, a extinção do pecúlio estimulou muitas indagações.

O que pensa o Poder Legislativo sobre a questão
O Congresso Nacional votou o Projeto de Lei 78/2007, mas ele foi vetado pela Presidência em janeiro de 2008. Entretanto, outros projetos de lei estão em andamento e, com certeza, após o pronunciamento do STF, certamente o Ministério da Previdência proporá a regulamentação da matéria.

A que conclusões jurídicas a discussão pode levar? 
O debate permitiu uma nova reflexão do ato jurídico perfeito, da renúncia, da norma mais benéfica, da titularidade do direito às prestações, do destino das contribuições vertidas após a aposentação, da concretização de valores constitucionais e mais, da necessidade de a política governamental acompanhar a evolução da dimensão fática previdenciária e conectá-la ao plano normativo da ordem jurídica, sobretudo, pelos seus valores axiológicos que sustentam e dão vida a uma coletividade politicamente organizada.

Revista Consultor Jurídico,

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