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Idosos do lado de fora


MPF denuncia a Caixa Econômica por proibir maiores de 65 anos de se inscreverem em programa habitacional para famílias de baixa renda
Lúcio Lambranho

A Caixa Econômica Federal (CEF) está sendo acusada pelo Ministério Público Federal de discriminar idosos ao limitar a 64 anos a idade máxima para adesão ao Programa de Arrendamento Residencial (PAR), voltado para famílias de baixa renda. Representantes do MPF na Bahia e no Distrito Federal já entraram com duas ações na Justiça Federal pedindo o fim da restrição.

Segundo os procuradores da República, a limitação etária imposta pela Caixa contraria dispositivos da Constituição Federal e do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03). Sancionado pelo presidente Lula em outubro de 2003, o Estatuto prevê a reserva de 3% das vagas dos conjuntos habitacionais criados pelo governo federal para brasileiros com mais de 60 anos.

Também criado há quatro anos pelo Ministério das Cidades, com um investimento total de R$ 2,3 bilhões, o PAR tem como objetivo atender famílias de baixa renda, cujos vencimentos não ultrapassem a casa dos R$ 1.800,00. De acordo com o Ministério das Cidades, 96,3% das famílias que não têm casa própria no país recebem cinco salários mínimos ou menos por mês.

O contrato entre a CEF e os arrendatários do programa prevê o pagamento de parcelas mensais por 15 anos. Após esse período, o arrendatário tem a opção de compra do imóvel. Para concretizar o sonho da casa própria, o arrendatário precisa, então, quitar o saldo residual.

Ao ser questionada pelo MPF sobre a restrição etária, que não havia sido determinada pelo Ministério das Cidades, a Caixa "admitiu ter criado essa espécie de 'obstáculo etário', por julgar imprescindível a cobertura securitária tanto das unidades habitacionais (a cargo da construtora), quanto a dos arrendatários (em casos de morte ou invalidez permanente), cujo encargo recai sobre estes últimos".

Segundo o banco estatal, o valor do prêmio seria muito elevado caso pessoas com mais de 65 anos também pudessem aderir ao programa, uma vez que o prazo de vigência do PAR, de 15 anos, é inflexível.

"E as seguradoras somente garantiriam cobertura de risco até os 80 anos de idade do arrendatário, em face da expectativa de vida do brasileiro (71,3 anos) prevista pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)", diz a Caixa, em resposta a uma das ações do MPF à qual o Congresso em Foco teve acesso.

Caixa admite revisão

Procurada pela reportagem, a Caixa informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que está cumprindo um termo de ajuste de conduta com a Justiça Federal para se adequar ao Estatuto do Idoso nos municípios de Porto Alegre (RS) e Aracajú (SE). A Caixa também disse que as apólices de seguro dos imóveis para as pessoas com idade superior a 65 anos serão assumidas pelo banco a partir de agora nessas duas cidades.

Apesar do ajuste de conduta, a Caixa recorreu, no último dia 9, de uma liminar concedida em favor da ação civil pública do Ministério Público Federal na Bahia. A decisão da 12ª Vara Federal derrubou temporariamente o limite de idade para adesão ao PAR apenas no estado, apesar de o pedido ter abrangência nacional. Em caso de descumprimento, a Caixa fica sujeita à multa de R$ 50 mil por idoso excluído do programa.

Questionada novamente pela reportagem, a assessoria de imprensa da Caixa informou que o setor jurídico da instituição tem como praxe recorrer de qualquer decisão da Justiça, mas que não deve prolongar essa disputa judicial. "A Caixa pretende procurar o MPF na Bahia e no DF para fazer de conduta que sirva para todo o país", acrescentou.

O juiz Valter Leonel Coelho Seixas, que concedeu a liminar na Bahia, considerou que o direito à moradia viabiliza o exercício de outros direitos de importância constitucional, como o direito à privacidade, à segurança e à saúde. "O direito à moradia é núcleo central do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana", diz a sentença.

O procurador da República na Bahia Sidney Madruga, autor da primeira ação contra a medida da Caixa, informou ao site que procedimentos semelhantes serão ajuizados, nos próximos dias, nas Procuradorias da República em São Paulo e no Rio de Janeiro.

"Aqui [na Bahia] a Caixa disse que não faria a contestação da liminar, mas fez. De qualquer maneira, acho difícil a decisão de liminar ser revertida em favor da Caixa", avalia. "A portaria da Caixa contraria até mesmo o Ministério das Cidades, que criou o programa e não impõe nenhuma idade limite. A posição do Ministério Público é em favor do social. A da Caixa é oposta e está baseada em números", diz o procurador da República.

Já ação civil pública da Procuradoria da República no Distrito Federal tramita na 17ª Vara Federal desde o último dia 17. O caso está nas mãos da juíza Cristiane Pederzolli Rentezsch.

Preferência para idosos

O presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados da Força Sindical, João Batista Inocentini, foi informado pelo Congresso em Foco sobre a limitação etária imposta pela Caixa e as ações na Justiça. "Isso é uma descriminação e contraria o Estatuto do Idoso e a Constituição Federal. Vamos procurar nossos direitos e denunciar esse abuso", afirmou Inocentini.

Segundo ele, há dois meses o sindicato negocia com o governo federal estímulos para pessoas da terceira idade nos conjuntos habitacionais criados por meio das ações do Ministério das Cidades.

Uma das reivindicações do Sindicato Nacional dos Aposentados é a reserva dos andares térreos para idosos e o cumprimento do Estatuto do Idoso. "Esse percentual de 3% não é cumprido porque ninguém está cobrando. E o problema nesse programa é que a Caixa só pensa no lucro e parece que o governo sempre quer ganhar algo em seus programas sociais", critica Inocentini.

O procurador-regional dos Direitos do Cidadão na Procuradoria da República no Distrito Federal, Wellington Divino Marques de Oliveira, autor da segunda denúncia contra a Caixa, pede que a liminar seja estendida para todo o país. "Impossível, pelo menos enquanto viger a Constituição Federal de 1988, que qualquer regulamento restrinja o acesso dos idosos ao PAR, a não ser que se despreze o princípio da legalidade", aponta na ação o procurador do DF.

Wellington Divino também destaca a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região em favor de um mandado de segurança impetrado por dois idosos no Rio Grande do Sul. Segundo a decisão, a Caixa "praticou ato ilegal, violador de direito líquido e certo dos apelados." "No caso dos idosos, isso significa que as ações estatais serão pautadas pela consideração de suas necessidades especiais. Daí a referida norma do Estatuto, garantindo-lhes preferência e reserva de vagas em programas habitacionais.", diz a decisão do TRT da 4ª Região.

Em números

O governo tem comemorado os resultados do PAR. Desde o início do programa, 179 mil famílias já foram beneficiadas "com a casa própria, trazendo benefícios diretos para o setor de construção civil", diz comunicado da Caixa à imprensa.

Segundo o Ministério das Cidades, só em 2003, primeiro ano do programa, foram beneficiados 293 empreendimentos, com 43,8 mil unidades habitacionais, no valor de R$ 1,1 bilhão. Já em 2004 foram contratados 188 empreendimentos no valor total de R$ 869,6 milhões para atender a 33,5 mil famílias. Outros R$ 355 milhões foram financiados em 2005, de acordo com a Caixa.

Mas a determinação da Caixa de restringir a idade para adesão ao Programa de Arrendamento Residencial ignora os dados sobre a população idosa no Brasil, que - com mais de 18 milhões de pessoas - representa 10% da população nacional. Mais de 5,6 milhões deles trabalham em todo o país. Os idosos chefiam cerca de 65% das famílias brasileiras.

A maioria dos aposentados, no entanto, vive com pouco dinheiro. O salário mínimo de R$ 375 corresponde a 38,71% dos benefícios pagos pelo INSS na população urbana e a 99% dos benefícios concedidos aos trabalhadores rurais, segundo dados divulgados em julho pelo Ministério da Previdência Social.

site: Congresso em Foco

 

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