- Entrevista Outubro de 2013 / Novembro de 2013
Até bem pouco tempo considerado o “país do futuro”, o Brasil está envelhecendo. A cada ano, tem mais 700 mil idosos (pessoas acima de 60 anos, segundo a Organização Mundial de Saúde – OMS) entre seus habitantes. A mudança foi iniciada nos idos dos anos 1980 e só percebida após os 1990. Hoje, essa parcela da população já soma 23 milhões de pessoas. Foi um processo rápido, que não deu muito tempo para que fossem criadas políticas públicas que atendessem a essa parcela da sociedade. À frente da Universidade Aberta da Terceira Idade (UnATI) há 18 anos, o médico Renato Veras afirma que a solução é investir em prevenção e monitoramento para que essas pessoas tenham perspectivas a longo prazo. “Precisamos nos preparar para essa nova realidade. É impossível que qualquer sociedade jogue fora 40 anos de vida ativa de uma massa tão grande de pessoas”, frisa. Brasil é um país jov O Brasil está mais velho?
Sim, estamos envelhecendo muito. O Brasil e outros países em ascensão econômica, como o México, a Índia e a China, hoje possuem uma proporção grande de pessoas que vivem mais. Isso se deve ao crescimento econômico, pois ajuda a população a se alimentar melhor, estar medicada, buscar qualidade de vida. Também tem a ver com a queda da taxa de natalidade, pois as mulheres trabalham e têm acesso a muitas informações, o que faz com que tenham menos filhos.
O que mudou efetivamente dos anos 1970 e 1980 para cá?
A realidade mudou radicalmente. O país não é mais o país da “garotada”. Hoje, o Brasil é um país jovem de cabelos brancos. Temos uma parcela de habitantes jovens de até 16 anos que representam um desafio e, na outra ponta, uma outra grande parcela que também precisa de cuidados. Hoje, 11,5% da população brasileira é composta por idosos. E é um processo ascendente. A cada ano, o país tem mais 700 mil pessoas com idade acima de 60 anos. É algo novo, que os países desenvolvidos já encaram há muito tempo e, por isso, tiveram a chance de se estruturar. Nós, não. Hoje temos uma desorganização social que envolve questões desde familiares até previdenciárias.
O que é possível fazer para atender a essa parcela da população?
Precisamos nos preparar para essa nova realidade. É impossível que qualquer sociedade jogue fora 40 anos de vida ativa de uma massa tão grande de pessoas. Temos que inserir esses indivíduos na sociedade. O idoso fragilizado não é mais preponderante, não é mais majoritário. Por isso, precisamos ter ações e políticas sociais, de saúde e previdenciárias que os atendam.
O senhor teria exemplos práticosnessa direção?
Por exemplo, precisamos ter no Brasil profissionais especializados nessa área. Sabemos que há um desgaste orgânico do ser humano nessa faixa etária, então vamos investir na questão da saúde. Hoje, menos de 8% das faculdades de medicina têm a disciplina Geriatria em sua grade. Precisamos ter campanhas maciças que despertem a sociedade para o fato de que realmente estamos vivendo mais, programas de TV que discutam as melhores saídas, um atendimento público e privado que queira investir em prevenção. Cuidar do idoso não é caro se houver atendimento
Como assim?
O idoso não é um adulto jovem e não deve ser tratado como tal. Nessa época, sabe-se que as doenças passam a ser agudas e aí, sim, o tratamento fica caro. Porém, se houver acompanhamento e ações preventivas, será possível obter mais qualidade de vida e reduzir os custos. Aqui na UnATI, trabalhamos com essa linha de estudo baseada em prevenção e monitoramento. Realizamos exames periódicos, fazemos rastreamento, o que nos possibilita detectar a doença o mais precocemente possível.
Como é o trabalho da UnATI, e qual é a diferença dela para outras instituições que trabalham com a terceira idade?
Somos um centro de convivência e de atividades lúdicas e de formação. Hoje, temos 125 diferentes atividades, englobando desde os cursos para idosos até a formação em ensino médio e superior. Durante esse trabalho, se o técnico que acompanha nota alguma diferença na rotina do aluno, ele já o encaminha para os nossos ambulatórios. Temos uma estrutura completa na área de saúde, que nos permite desempenhar esse papel ativo. Nosso projeto é de saúde, de formação e de qualificação para que os idosos tenham perspectivas de longo prazo. Isso garante que eles se sintam valorizados, e isso é essencial nessa fase da vida. Incentivo outras instituições a fazerem o mesmo, como o Sesc, por exemplo, que tem um trabalho nessa área. Acho que a multiplicação é a melhor opção.
Que dicas o senhor daria para um envelhecimento saudável?
Comece agora a mudar seus hábitos, mesmo que nunca tenha feito nada nessa direção. Alimente-se bem, faça atividades físicas – mesmo que seja uma caminhada –,busque programas de integração social para conhecer pessoas novas, interagir com a família e fazer amigos e, finalmente,tenha planos e projetos.
MÉDICO, PROFESSOR ASSOCIADO DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO/UERJ, RENATO VERAS É DIRETOR DA UNIVERSIDADE ABERTA DA TERCEIRA IDADE (UNATI) HÁ 18 ANOS. COM MESTRADO NO INSTITUTO DE MEDICINA SOCIAL/UERJ E NA LONDON SCHOOL OF HYGIENE AND TROPICAL MEDICINE (LSHTM), DE LONDRES, E DOUTORADO (PHD) NO GUY’S HOSPITAL DA UNIVERSIDADE DE LONDRES, ATUA NAS ÁREAS DE SAÚDE COLETIVA E GERONTOLOGIA.
SUA ÁREA DE PESQUISA É “ENVELHECIMENTO E MODELOS
PREVENTIVOS NA TERCEIRA IDADE”, TENDO VÁRIOS ARTIGOS PUBLICADOS NAS PRINCIPAIS REVISTAS CIENTÍFICAS. É PESQUISADOR DO CNPQ E CONSULTOR DE ALGUMAS AGÊNCIAS E ÓRGÃOS NACIONAIS E INTERNACIONAIS. NOS ÚLTIMOS ANOS, TEM-SE DEDICADO À CRIAÇÃO DE MODELOS DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL PARA OS IDOSOS. PUBLICOU ALGUNS LIVROS, ENTRE ELES PAÍS JOVEM COM CABELOS BRANCOS E GESTÃO CONTEMPORÂNEA EM SAÚDE.